O resgate do soldado Ryan
"Inteligência militar é uma contradição em termos"
Groucho Marx.
A tão falada seqüência inicial deste filme era para ser, supostamente, uma realista descrição da invasão da Normandia pelos aliados em 6 de julho de 44, historicamente conhecida como o Dia D. Mas o resultado final é pífio e só impressiona os mais ingênuos e impressionáveis. O diretor Steven Spielberg comete algumas cenas dignas de filme trash, achando que está mostrando os horrores da guerra. Como aquela cena em que um soldado observa o próprio braço decepado numa explosão, ou aquela do soldado que é salvo de um tiro por seu capacete, resolve tirá-lo para ver onde a bala havia acertado, e imediatamente leva um tiro na cabeça. Não há como não rir dessas seqüências, e o pior é sensação de já ter visto esse tipo de cenas antes, em filmes que supostamente não exalavam tamanha seriedade como esse. Tudo se resolve da pior maneira, nas primeiras cenas os aliados estão sendo massacrados pelos alemães, mas numa daquelas mágicas do cinema é preciso apenas um tiro para que as defesas alemães caiam por terra e o filme comece a entrar pelo cano.
Ao contrário do que possa parecer Spielberg não esta disposto a discutir a estratégia do ataque à Normandia, não é exatamente sobre isso que o filme trata. Spielberg sequer teria coragem para algo assim, pois sempre que toca no assunto segunda guerra mundial é num tom respeitoso, quase didático. Deixa a entender, no entanto, que foi tudo uma zorra desgraçada, e que ninguém fazia a menor idéia do que estava fazendo ali.
Mas o filme não é sobre o Dia D, e sim sobre o tal soldado Ryan. Mas sinceramente não consigo acreditar nessa bobagem do tipo: "o exercito americano se importa com você". Spielberg usa a narrativa em flashback para contar a história, supostamente baseada em fatos veridicos, do soldado Ryan dado como desaparecido durante a invasão da Normandia, que ganhou a chance de voltar para casa mais cedo, pois todos seus irmãos morreram recentemente em combate. A idéia do exército americano é a seguinte: já que os outros morreram, vamos salvar o que restou. Então um grupo de soldados liderados por Tom Hanks sai pela Europa, devastada pela guerra, numa missão de considerável risco, perguntando para quem encontrar pelo caminho se eles ouviram falar do tal Ryan. Nada mais improvável.
Não consigo imaginar nenhum exercito no mundo inteiro, que no meio de um esforço de guerra vá perder seu tempo se preocupando com esse tipo de detalhe. Mas Spielberg quer fazer com que a gente acredite nisso.
O roteiro esquematizado e cheio de clichês não ajuda em nada, é tolamente patriótico e fartamente piegas. No final a gente não fica sabendo se toda essa palhaçada valeu a pena, se o soldado Ryan "fez por merecer" o esforço do seu resgate, não ficamos sabendo nada de sua vida após a guerra. E dessa forma a programada catarse final acaba sendo meio inútil e desnecessária.
(Saving Private Ryan, Eua 1998) Direção: Steven Spielberg. Elenco: Tom Hanks, Tom Sizemore, Edward Burns, Matt Dillon, Adam Goldberg, Barry Pepper, Vin Diesel, Giovanni Ribsi. 170 mim.