Mais escritor, mais pesquisa, mais editor, mais tudo!!!
Seria preciso um completo idiota para estragar um livro sobre Tim Maia, o tipo de personagem que é o sonho de consumo de qualquer biografo. O problema é que o jornalista e produtor musical (sic) Nelson Motta, o eterno garoto da terceira idade, estava a altura do desafio. Em "Vale Tudo: O som e a fúria de Tim Maia" (Objetiva, 392 pág.) Motta narra as desventuras de Tim Maia ora como fã incondicional, noutras como amigo, mas poucas vezes com alguma objetividade. Ao ponto de usar a primeira pessoa para se inserir na história quando necessário. O que convenhamos é o fim da picada.
O livro acompanha a trajetória de Tim desde sua ida com a cara e a malandragem para os Estados Unidos em 1959, passando pelos altos e baixos de sua carreira na volta para o Brasil. Numa das raras vezes que Motta se indigna a fazer algum comentário crítico, só confirma o óbvio: quando Tim pegou a febre da disco e a pneumonia da cocaína no final dos anos 70 sua carreira, literalmente e metaforicamente, nunca mais foram as mesmas. Cocaína e qualidade musical são duas coisas inversamente proporcionais.
Desta forma "Vale Tudo" funciona melhor como uma compilação de frases, "aforismos" de Tim Maia do que uma biografia. Sem falar que trata-se de uma verdadeira enciclopédia de gírias para o consumo de drogas: desde bauretes e manga-rosa , para maconha passando por fazer a maquiagem, ou dar um realce, aquele mesmo do Ministro da Cultura, para cocaína. Sem falar no uso da expressão "levado" como pagamento, que é repetida umas cem vezes no livro.
Motta investe numa narrativa leve e solta, mas pouco elucidativa, e concentra grande parte de suas páginas nos últimos anos de vida de Tim Maia. Deixando os anos 70, o período mais criativo do cantor, cheio de lacunas e histórias inacabadas. Por outro lado ninguém precisa saber o nome de cada músico que passou pelas inúmeras formações da banda Vitória Régia.
Para piorar as coisas, Nelson Motta usa a biografia de Tim para fazer um dos seus passatempos prediletos: elogiar amigos e parceiros. Tendência já exercitada a exaustão no seu livro anterior Noites Tropicais. Mas aqui comete exageros desmedidos como chamar a música "Assim Caminha a humanidade" de Lulu Santos como um dos maiores hits da década de 90. Menos, menos...
O livro acaba com a morte de Tim em março de 1998, em conseqüência de um somatório de excessos que permearam a vida do cantor. No entanto não há uma linha sequer sobre a divisão do espólio, grande parte de dívidas, do cantor ou o que aconteceu com os inúmeros processos, 300 segundo a revista Veja, contra e a favor pendentes na justiça.
No fundo Tim Maia viveu o "brazilian way of life" em sua plenitude: gastou sempre mais do que tinha, fez mil trapalhadas, brigou com tudo e com todos, mas nunca se abalou ou mostrou arrependimento. Ficando sempre, no final das contas, numa relax, numa boa. O fato de Tim fumar uns 20 baseados por dia talvez explique muito. Nesse ponto Motta acerta a mão. Pois se esse livro fosse escrito por Ruy castro, o apetite pela destruição de Tim seria tratado como uma doença e o cantor transformado em vitima.
Parafraseando o próprio Tim: livro é uma bosta, mas biografado é um gênio.
Passagens curiosas: Marisa Monte teria incluído os versos "não quero cocaína, me liguei no chocolate", na sua regravação de Chocolate para o seu primeiro álbum por detestar a droga. Hum. Tem produtor que cego...
Já durante o trecho que trata da imitação de Tim Maia feita pelo falecido Bussunda, Motta revela que haveria "supostamente" um gay na turma do Casseta e Planeta. O que explica muita coisa...
P.S.: Se vocês estiver folheando o livro numa livraria qualquer vá direto para a pág 303 e testemunhe uma foto que marca o encontro entre Tim, Marisa Monte e, adivinha, Carlinhos Brown, ele mesmo, em 1992. Tipo, não precisa dizer mais nada... Se algum vendedor interromper sua leitura grite: estratégia e saia correndo...