O Rappa - Instinto Coletivo Ao Vivo

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Uma das coisas mais curiosas sobre o rock no Brasil é a fixação doentia em álbuns duplos. Parece que é impossível conter a criatividade e inteligência do roqueiro brazuca em um disco simples. A mais nova vítima desta overdose musical sem sentido é O Rappa que lançou Instinto Coletivo Ao Vivo, um dos maiores desastres do ano.

Para começar é preciso dizer que O Rappa é uma banda de estúdio. Com o auxílio de um produtor e cercado de tecnologia a grupo consegue criar algumas boas canções. Porém quem já assistiu a um show ao vivo da banda comandada pelo vocalista Falcão sabe que eles são uma farsa. O Rappa sempre acaba destruindo as versões das suas próprias músicas, inserindo em quase todas uma espécie de jam entre os músicos. O tipo de coisa que faz quem está em cima do palco feliz, mas só consegue arrancar bocejos de tédio da platéia.

É óbvio que os dois cds de Instinto Coletivo Ao Vivo funcionam como o antídoto perfeito para a insônia. Aliás, no segundo cd existem algumas faixas de estúdio em uma tentativa de livrar a cara da banda. Infelizmente o truque não funcionou. As músicas de estúdio estão entre as piores coisas que o grupo já produziu. Falando em produção, talvez para compensar a falta de talento O Rappa resolveu investir tanto na área. Para que se tenha uma idéia, o disco traz canções gravadas no estúdio de Tom Capone, o famoso "Toca do Bandido". Inclusive com a faixa "Ram", que foi mixada pelo grupo inglês Asian Dub Foundation, em Londres. Como uma espécie de "plus a mais" ainda existe a música Fica Doido Varrido, que o grupo gravado em 87 para o carnaval da MTV.

Como timing é tudo O Rappa conseguiu a proeza de compor a música mais equivocada do ano em "Ninguém Regula a América", com a participação do Sepultura. Pela letra o grupo deixa claro que os Estados Unidos devem deixar de ser a polícia do mundo. Os americanos não devem mais se intrometer onde não são chamados, deixarem os demais países viverem em paz. Só que com a Guerra Contra o Terror, causada pelo atentado as duas torres do World Trade Center, o mundo veio implorar que o Tio Sam passe a ser uma espécie de cassetete mundial.

Mesmo que política não seja o forte da banda é preciso admirar a honestidade do seu trabalho ao vivo. Eles poderiam ter editado algumas faixas, regravado alguns sons no estúdio, mas não o fizeram. Instinto Coletivo é um retrato absolutamente fiel de como O Rappa soa ao vivo (a música Todo Camburão Tem Um Pouco De Navio Negreiro dura inacreditáveis 11 minutos). A impressão que fica é de ter assistido um show do grupo. O ouvinte termina se sentindo como alguém da platéia depois do espetáculo. Ou seja, achando tudo um tremendo pé-no-saco.

Por isso fuja de Instinto Coletivo Ao Vivo. Lembre-se que o melhor que O Rappa já fez são justamente os clips para a MTV. E isto não é necessariamente uma garantia de qualidade. Quando uma banda prefere investir mais em videoclips do que na música é sinal de falência musical. Aliás, pior do que um disco ruim são dois discos ruins. Mas fazer o quê? Às vezes o tamanho do ego do roqueiro brasileiro é inversamente proporcional ao seu talento.

J. Tavares