Diário do Fim do Mundo


20/11/2001 - No reino dos dedos-duros

Se tem coisa uma coisa detestável na natureza humana, é sua incrível capacidade de dedurar o próximo. Os dedos-de-seta, como diria, Bezerra da Silva são um verdadeiro entrave à civilização. Gente que sobe na vida usando como escada o pescoço dos colegas e como corrimão o saco do chefe. Você com certeza conhece pessoas assim. Inclusive, elas devem estar apontando para você neste exato instante.

Pois, nos Estados Unidos, um país que até bem pouco tempo atrás prezava sobremaneira os direitos individuais, resolveu voltar aos tempos do Macarthismo. Sim, esta é a hora e a vez dos dedo-duros. Não é nenhum exagero ou loucura. Em tempos de Guerra contra o Terror, qualquer americano patriota pode fazer uma ligação anônima ou mandar um e-mail para o FBI ou para a polícia federal se desconfiar que, por exemplo, o seu vizinho é um terrorista.

Para quem não acredita que isto possa ser verdade basta dar uma conferida no site do FBI (www.fbi.gov). Lá é fácil descobrir como entregar qualquer um que você ache suspeito. Para quem mora nos Estados Unidos e quer livrar de alguma pessoa chata, isto é uma alternativa limpa e saudável. Na teoria, após a denúncia alguns oficiais de ternos e óculos escuros vão fazer uma visita ao seu prédio ou a sua casa. Se o morador do lado tiver mesmo cara de árabe ou seguidor de Osama Bin Laden, é quase certo que ele será preso.

Rapidamente o novo esporte nacional dos americanos é mandar qualquer suspeito para a prisão. Nos dias atuais, medo e paranóia movem os países do primeiro mundo. Desde o dia 11 de setembro mais de 1.500 foram presas no país. A maioria, é claro, por denúncias anônimas. Vale lembrar que no direito norte-americano a pessoa é considerada culpada até que prove a sua inocência.

Mesmo assim, quase todas as pessoas presas acabaram soltas depois de algumas investigações preliminares. Em princípio, apenas quatro pessoas podem estar relacionadas com atos terroristas. O resto levou um susto, talvez uns tapas na orelha, e deve ter descoberto da pior maneira possível que aquela história da América ser a terra da liberdade não é bem assim.

Nesta triste história uma morte foi registrada pelo vírus dedus-durissimus. O loser chamava-se Muhammad Rafiq Butt, 55, um paquistanês. Muhammad estava com problemas no passaporte. Um vizinho, que era pastor evangélico, o denunciou. O FBI chegou, patrolou a porta e levou pobre paquistanês para a cadeia. Depois de 24 horas descobriu que Muhammad era inocente. Enquanto estavam organizando os papéis para devolver a liberdade a Muhammad teve um ataque do coração e morreu.

No Brasil, por sorte, ser dedo-duro ainda não virou moda. Até mesmo por que no dia em que entregar um colega para colocá-lo na cadeia for um bom negócio ia falar prisão por aqui...

Da equipe de articulistas

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