Diário do Fim do Mundo

26/10/2001 - Os estudantes no poder

O atual governo do Afeganistão rapidamente se transformou em um dos maiores problemas da humanidade. Infelizmente as ações criminosas perpetradas pelo regime talibã eram absolutamente previsíveis. O FBI, a CIA, ou Agência de Inteligência de Defesa americana, apesar de consumirem desde 1950 a astronômica quantia de US$ 7 trilhões, falharam de maneira clamorosa ao não prever que este grupo de radicais islamicos iria mudar a face do mundo e dar uns retoques na cidade de Nova Iorque.

Bastava a inteligência militar do Estados Unidos ter prestado atenção a um simples detalhe: a palavra talibã no idioma árabe, significa estudante. O regime fundamentalista que domina o Afeganistão é composto de acadêmicos. É como se, de repente, o Diretório de Estudantes da sua faculdade tomasse o poder no Brasil. Como se o congresso fosse comandado por alunos de uma faculdade de comunicação, por exemplo.

A tragédia de 11 de setembro de 2001, na verdade, é apenas um reflexo tardio do Maio de 68 francês. Para quem não sabe neste mês o país do Arco do Triunfo parou. Um movimento estudantil que começou na faculdade de letras de Nanterre, na noite de 22 de março. No local, 300 estudantes de maioria trotskista se reuniu anfiteatro para protestar contra a prisão de membros do Comitê Vietnam Nacional. Raidamente um grupo de militantes acaba tomando conta do pavilhão administrativo aos gritos: "Não a Universidade burguesa".

Daí para frente os estudantes enlouqueceram. É verdade que a França vivia uma crise social violenta desde 1967. Mas foi o pessoal das universidades que fez a revolta eclodir. Durante o mês de abril surgiram manifestações operárias ampliando o efeito estudantil. A polícia acabou invadindo a faculdade e tentou expulsar os alunos que estavam ocupando a Sorbonne. As centrais dos estudantes decretam greve. Os manifestantes resolvem enfrentar os policiais e criam barricadas. Os cursos das universidades terminam sendo suspensos e alguns estudantes são presos e condenados a dois meses de detenção.

O movimento dos estudantes toma força e sobre porrada para todos os lados. No primeiro dia 2.000 estudantes aparecem no Quartier Latin, no segundo confornto o número cresece para 20.000. O saldo das batalhas: 600 feridos, 442 prisões, com 31 mantidos estudantes presos. Os estudantes do interior resolvem apoiar a ação dos colegas de Paris. O Partido Comunista é chamado a participar do movimento, mas se nega apenas reclamando da ação policial.

No meio da confusão os operários aderem em número crescente a greve. Em 13 de maio ocorre uma gigantesca manifestação com a presença de aproximdamente 200.000 pessoas. Os alucinados estudantes invadem e ocupam a Sorbonne. Depois de tomar conta do lugar resolvem instalar centros para discussão sobre política ou qualquer outro assunto numa notável falta do que fazer. Surge pichada nos muros da faculdade uma das mais famosas frases do movimento. "É proibido proibir".

No 20 de maio, com 10 milhões de trabalhadores em greve, a França começa a pedir arrego. Depois de 10 anos no poder (regime parlamentarista) o governo entra em crise. No dia 24, mais barricadas e novos confrontos ocorrem Quartier Latin. Os trabalhadores enchem o saco e desistem de apoiar os estudantes. Em 30 de maio o movimento começa a perder força. O general De Gaulle, que estava decidido a se afastar do poder, volta e enfrenta a situação política. O movimento estudantil perde a força e a ordem no país se restabelece. Tudo volta a ser como antes.

Apesar de parecer um movimento justo e organizado o Maio de 68 pode ser chamado de a Revolução dos porra-loucas. Basta ver quais eram os pedidos dos estudantes: 1. Instalação imediata de um poder estudantil real nas faculdades, com direito a voto absoluto sobre todas as decisões; 2. Autonomia das universidades e faculdades; 3. Extensão da luta contra o conjunto dos setores que divulgam a ideologia dominante, quer
dizer, a informação; 4. Realização da junção real com as lutas dos trabalhadores e camponeses. Colocando a
contestação do poder que se faz nas fábricas e nas estruturas profissionais.

Se alguém espera mudar o mundo com estas reivindicações, só pode estar bricando. Mesmo assim os estudantes franceses venceram. Conseguiram fazer uma revolução. O problema é que ela foi ocorrer mais de trinta anos depois no distante Afeganistão. Os talibãs (estudantes) tomaram o poder e instalaram um regime fundamentalista de deixar o Pinochet com inveja. Moral da história? Estudante no poder é que nem a candidatura do Lula à presidência: nunca vai dar certo.


Da equipe de articulistas



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